quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

ainda falando da pausa

(Gostando da idéia de publicar e-mail em blog, a Ana, minha interlocutora, respondeu meu e-mail e colocou ele AQUI. Acabei respondendo o dela também, veremos onde isso vai dar...)



Aninha,
Acho que o "clique" começou naquela noite em que nós assistimos o quarteto do Messian lá na fundação, lembra? Foi aí que eu escrevi aquele conto do quarteto para o fim do tempo e depois fui acumulando idéias para compor o romance que teve aquele conto como origem. Só que depois de escrever um caderno e meio de idéias, eu meio que me senti "pronta" para escrever aquilo, e comecei a escrever devagarinho, trecho por trecho, num caderno, quando eu estava lá em Nova Iorque. Até a noite em que você disse para mim do MÉTODO e daí rolou o clique e eu entendi que eu precisava sentar e acabar com aquilo de uma vez, se não, como você disse, eu ia ficar fazendo mil versões e não conseguiria terminar nenhuma. Percebi que se eu fizesse tudo de uma vez, de versão em versão, eu ia sofrer e fazer bagunça demais. Então, acho que esse clique é mais uma decisão do que qualquer energia cósmica: Estou com tempo livre até março, então, porque não terminar isso agora? Faltam apenas três capítulos e a primeira versão estará pronta. É uma versão fraca, cheia de buracos, mas é uma visão do todo escrita, de modo que eu não vou precisar me preocupar com minha memória ruim na revisão. Pra mim tem que ser igual tomar remédio ou injeção: é de uma vez. Ou como diz a Júlia, "literatura de guerrilha".

Que legal esse seu sonho, Ana! Esqueci de te contar uma coisa. Outra noite sonhei que você estava fazendo uma performance na praça da liberdade (sabe aquela parte na frente da biblioteca, onde ficava o Fernando Sabino e seus comparsas?). Acho que é porque eu tô terminando de ler a Odisséia. Você encarnava a penélope, levava uma cadeirinha até a praça, tinha um monte de linhas e tecidos, e começava a bordar. Bordava até escurecer, e quando escurecia, você começava a desfazer o bordado. Depois, se levantava, juntava suas coisinhas e ia embora. Me lembro que você não deixou ninguém tirar foto daquilo. Então: estava tudo perdido e isso me deu vontade de bater em você no sonho. Você disse que o momento tinha que ser o momento, que não dava pra ficar aprisionando ele. Enfim: essa tristeza mansa, que você disse estar sentindo de vez em quando, vou roubá-la pra pôr no livro, pode? A Eira, que eu acho que é a personagem principal do livro (acho, porque eu ainda nao sei sobre o que esse livro se trata de verdade, juro pra você, ele é todo manchado) vai falar dessa tristezinha. Ela é uma pessoa extremamente sozinha, coitada. Da dó de ver. Acho que isso é o que mais me incomoda na historia. Quando eu terminar de escrever, talvez eu consiga saber do que ele se trata. Mas isso é sempre a última coisa. Eira nao sente a sua dor no estômago, mas ela tem uma perna ruim (dessas que doem no frio ou quando está para chover), fruto de um acidente de carro que ela teve. Mas, o que é essa tristeza, hem? Ela é meio azul, na cor dos desenhos que você tá fazendo, ou ela é gutural, mais vermelha, ou cinza, ou negra?

Acho que muitos sonhos à noite são um bom presságio. Sério.

E eu gosto dos seus emails longos, são meio que um descanso. É bom conversar contigo, Ana, você entende, e eu não me sinto mais sozinha. Estou um nojo de anti-social, e sabemos que Laurinha não é assim. Ainda estou meio ansiosa, e bastante emocionada. Me lembro daquele trechinho da história do fim que você escreveu num post-it aqui em casa, quando a gente estava fazendo festa no meio do ano passado, bebendo lá em cima: "Não existimos. Tudo nos afeta". É isso. Muito obrigada por toda sua compreensão, você é um docinho. Em breve nos veremos,
Laura.

Obs.: Quando eu disse que eu estava escrevendo devagar, antes, esqueci de acrescentar que chega um ponto em que tudo estoura. Que as idéias ficam presas na cabeça da gente e predominam acima de qualquer pedacinho de cotidiano, ou qualquer outra história que eu gostaria de escrever. É bem como quando a gente tem aquela casquinha de machucado, e fica se esforçando para não arrancar...

3 comentários:

  1. Tenho tido muitos sonhos à noite. Mas acho que é por causa da casa nova, diz que dá sonhos. É diferente, agente fica esquisito pensando nos sonhos e eles ficam mais profundos.

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  2. foi mal, não tive tempo de ler. depois leio com mais calma.
    é, o Sérgio é meu tio sim. espero que goste da oficina.
    temos que marcar pra eu pegar a mochila. tem coisas importantes ali dentro.

    ps. era você no ponto de ônibus da olegário outro dia?
    era eu no ônibus, mas não tive certeza então na mexi com você, odeio passar vergonha.
    eu to trabalhando ali na contorno com prudente. mais fácil de nos encotrarmos!

    depois nos falamos.
    beijocas!

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  3. só uma pessoa saberá
    e que não me desmascare
    nem comente, decepcione, mencione

    percebe o mármore polido
    atacando quartzo liso em profunda fúria
    destaca de um papel furado
    bloco conciso de concreto
    em que
    persegue o carro encerado
    que roubaram do amigo
    na ânsia de um tempo que passou há muito tempo
    na roda do instantâneo
    nem
    uma pessoa quereria
    paga a paga ponta luminosa
    cintila e esvocaça no escuro
    debaixo da sola de um susto na não existência de uma consciente imperfeita reprodução
    que esqueça


    21-08-2010

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