terça-feira, 30 de agosto de 2011

Ossário (III)

Hoje de manhã havia uma menina no ônibus... Parecia que ela tinha passado a noite fora, pelo modo que ela quase dormia encostada no vidro, os cabelos presos e um cheiro de banho misturado a um cheiro de cigarro, misturado a uma maquiagem borrada num rosto meio sujo meio limpo. Estava tão cedo que o sol não tinha ainda ultrapassado a linha dos prédios, de modo que havia essa luz difusa em tudo, em todas as partes, mas em lugar algum.

Dormi pesado essa noite, digo, de ontem pra hoje. Havia algo naquela menina que me lembro uma cidade, me lembrou Berlim e outras cidades muito móveis que conheci muito mal, ou me lembrei especificamente do apartamento dele no fundo de um corredor muitíssimo comprido... Talvez tenha sido esse cabelo loiro da menina do ônibus. Outro dia Flora me mandou uma carta dizendo que viajar (como apaixonar-se) é uma experiência de morte, e talvez por isso essa necessidade de viajar tanto, para aprender a conviver num silêncio cotidiano com todo o sentido das coisas.

Passei hoje por quatro vezes em frente a um cemitério, e por volta das onze enterravam uma pessoa... Me lembro daquela viagem de trem que fizemos, e que decidimos parar no meio do caminho numa cidade que havia sido destruída na década de quarenta (não direi o nome da guerra ou da cidade) e nós víamos nos cartões postais imagens da cidade destruía, enquanto andávamos em lugares confusos e antigos. Disse que a mãe dele havia nascido lá, e havia essa noiva tirando fotos... Me impressiona como essas noivas adoram se casar entre ruínas, comentei a respeito de Ouro Preto, que havia sempre uma noiva.

2 comentários:

  1. ouro preto parece um cemitério, ou a menina de ressaca, borrada de maquiagem.

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  2. "viajar é uma experiência de morte". gostei muito disso. eu lembro de que quando eu viajei pra europa por 20 dias, (em cefalu, na italia, depois de passar por 4 países), eu tive uns sonhos esquisitos e no dia seguinte eu me sentia a morte em pessoa. mas eu estava muito são, e parecia compreender as coisas.

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