sexta-feira, 8 de outubro de 2010


a.bor.re.ci.men.to s.m. : 1 disse-me ontem que não estava conseguindo trabalhar por causa do calor e do canto onipresente das cigarras, bzzz, e era bem mais forte de manhãzinha e ao fim da tarde, quando o calor infernal começava ou começava a diminuir; soltar as amarras, por que o calor é feito de cordas apertadas que vão sufocando a pele da gente, o corpo da gente. É como febre, pegar um ônibus num fim de tarde num dia de calor. A sombrinha que abri para o sol, ontem, abri hoje para a chuva: tardou, foi contínua, e não sei se o céu abre de novo. O mormaço foi cedendo ao frio. Nenhuma cigarra canta, mas é como se cantasse. Bzzz. Não consigo abrir a página do livro que deveria ter lido há tempos; mas abri, criminosa, o Livro do Desassossego, e havia uma frase que começava falando assim do tédio: “sem definição”, não terminei de ler por causa do tempo, ai o tempo, fecho também este livro e me levanto, e percebo que a ampulheta de areia que fica na minha estante está virada de lado, interrompida ao meio 2 finjo que espero que o céu se decida, mas ele não se decide, então ainda posso fingir 3 Johnnatan diz que só escreve aquele que não tem um trabalho melhor, aquele que não tem nada a fazer, corrigiria se pudesse voltar no tempo, aquele que não tem mais nada a fazer 4 queria ter um dicionário grandão, que tivesse até seu nome dentro dele, que houvesse até mesmo o significado da palavra “areia”. Queria que já fosse sábado 5 supermercado 6 e Jean-Luc estava tão elétrico, como se estivesse bêbado, talvez seja isso, uma bebedeira que não se engole, mas que cai sobre o corpo da gente e a gente fica de ressaca antes da hora 7 talvez seja esta dona falando ao celular atrás de mim, brigando com alguém do outro lado da linha, dizendo, você pode me ouvir falar antes de gritar comigo? 8 ou um filme que eu já vi mil vezes, 9 marasmo

Um comentário:

  1. 10. é se sentar à noite com um copo de um vinho bem seco e um charuto vagabundo, e não ter nenhum poema pra escrever.

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